terça-feira, 9 de julho de 2013

Ben Goldacre - Não me Emburreça

Traduzido deste post de Ben Goldacre para o The Guardian, em 8 de setembro de 2005.

 

Nós rimos, nós choramos, nós aprendemos sobre estatísticas ... Ben Goldacre em porque escrever em Bad Science aumentou a sua suspeita da mídia por, ooh, muitos porcentos.


OK, aqui vai algo estranho. Toda semana em Bad Science, nós, ou vitimamos algum óbvio charlatanismo pseudocientífico, ou uma grande notícia científica em jornais nacionais. Agora, me diga, porque esses dois grupos estão sendo mencionados ao mesmo tempo? Porque a ciência na mídia é tão frequentemente sem propósito, simplística, chata, ou simplesmente errada? Como um pequeno Darwin, eu estive coletando espécimes, fazendo cuidadosas observações, e agora eu estou pronto para apresentar a minha teoria.

É a minha hipótese que nas escolhas das suas histórias, e na maneira que eles as cobrem, a mídia cria uma paródia da ciência, por conta própria. Então eles atacam esta paródia como se eles estivessem criticando a ciência. Nesta semana nós tiramos nossas luvas e escrevemos bastante.

Histórias científicas comumente caem em três categorias: Histórias malucas, histórias assustadoras e "Importantes descobertas". Ano passado o Independent publicou uma história maluca que gerou um editorial: Quantas histórias científicas ganham editorial de capa? Era sobre uma pesquisa pelo Dr. Kevin Warwick, propondo mostrar que assistir "Richard e Judy" melhorava a performance no teste de QI (www.badscience.net/?p=84). Não há necessidade de dizer que não são dados publicados, e altamente questionáveis.

Histórias malucas não terminam por aí. Elas nunca terminam. Infidelidade é genética, dizem cientistas. Alergia a eletricidade é real, diz pesquisadores. Eu tenho coletado histórias de "Cientistas encontraram a fórmula para" desde o último verão, cuidadosamente atando-as a grupos de espécimes, em preparação para o meu primeiro paper sobre o assunto. Até agora eu capturei a fórmula para: A melhor forma de comer sorvete (AxTpxTm/FtxAt +VxLTxSpxW/Tt=3d20), o melhor sitcom ( C=3d[(RxD)+V]xF/A+S) , o ovo cozido perfeito, amor, a piada perfeita, o dia mais deprimente do ano ([W+(D-d)]xTQ MxNA), e tantos mais. Chega! Todo paper - Incluindo este - abrange elas: e antes que qualquer pessoa alegue desculpas para elas, essas histórias são invariavelmente escritas por correspondentes de ciência, e calorosamente seguidas, com júbilo universal, com comentários em matérias, por graduados de humanas, em como doidos e irrelevantes os cientistas são.

Um próximo parente de histórias malucas é a paradoxal história de saúde. Todo Natal e Páscoa, regulares como um relógio, você pode ler que chocolate faz bem para você (www.badscience.net/?p=67), igualmente com o vinho, e com a mesma regularidade monótona, em esbaforidos, e ávidos tons você vai ouvir como é cientificamente possível comer a quantidade de gordura e carboidrato que você quiser, por alguma razão complicada, mas só se você o fizer na "hora correta do dia". Essas histórias só servem a um propósito: elas promovem a tranquilizante ideia de que o sensível conselho de saúde é antiquado e moralizante, e de que a pesquisa acerca disso é paradoxal e duvidosa.

No outro fim do espectro, histórias assustadoras são - claro - um bastião da ciência midiática. Baseada nas mínimas evidências e expandidas com pobres conhecimentos das suas significâncias, elas ajudam a performar a mais crítica função para a mídia, que é vender você, o leitor, para os patrocinadores. O desastre da MMR1 (Vacina tríplice Viral) foi uma fantasia totalmente criação da mídia (www.badscience.net/?p=23), que fracassou em ir embora. De fato o Daily Mail ainda está publicando histórias histéricas de anti-imunização, incluindo uma chamando a vacina para Pneumococo de "Triplo Soco", presumivelmente porque eles não entenderam que a meningite, pneumonia e septicemia que a vacina protege contra, são todas causadas pela mesma bactéria do Pneumococo (www.badscience.net/?p=118).

Agora, apesar da a crença popular do medo da MMR está - talvez - começando a ir embora, a compreensão popular dela continua mínima: pessoas periodicamente vem a mim e dizem, não é engraçado como o paper do Wakefield MMR acabou sendo má ciência no fim das contas? Eu digo: não. O paper sempre foi e ainda é um perfeito relatório de caso pequeno e sério, mas que foi sistematicamente mal representado como sendo mais do que isso, pela mídia que é incapaz de interpretar e reportar dados científicos.

Assim que um jornalista põe seus dentes no que eles acham que é uma história assustadora, aumentos de riscos triviais são apresentados, mas sempre usando um mesmo meio de expressar perigo, o "aumento relativo de risco", que faz o perigo aparecer desproporcionalmente grande (www.badscience.net/?p=8). Isso é antes de mencionarmos as vezes, como na semana passada com a história do Seroxat (Paroxetina)2, ou como as histórias de ataque do coração com ibuprofeno do mês passado3, quando na ansiedade deles de encontra escândalos, metade dos papers tinham dados incorretos. Esses erros, não dá para não notar, são sempre em uma direção.

E por último na nossa taxonomia, é a obsessão da mídia com novas "importantes descobertas": uma categoria de história científica mais sutilmente destrutiva. É bem compreensível do porque jornais sentem que é seu trabalho escrever sobre coisas novas. Mas no agregado, essas histórias vendem que a ciência, e em toda visão de mundo do empiricismo, é somente sobre tênues, novos, altos e calorosamente contestados dados. Artigos sobre temas emergentes e ideias robustamente suportadas seriam mais estimulantes, claro, do que a maioria dos experimentos de resultados únicos, e esses temas, a maioria das pessoas concordam, são o real desenvolvimento da ciência. Mas eles emergem em meses e em vários pequenos pedaços de evidências, e não em reembaralháveis comunicados de imprensa. Frequentemente, uma primeira página de ciência vai emergir de um comunicado da imprensa somente, e a publicação acadêmica formal nunca vai aparecer, ou aparecer muito mais tarde, e então nem mesmo mostrar o que o comunicado da imprensa disse que ele iria mostrar (www.badscience.net/?p=159).

Na última semana houve um interessante ensaio no jornal PLoS Medicine, sobre como novos achados de pesquisa vão acabar sendo falsos (www.tinyurl.com/ceq33). Ele presumivelmente gerou um pequeno fluxo de excitadas matérias de graduados de humanas na mídia, sobre como ciência é fabricada, autoengrandecedora, mantenedora de hegemonia, absurda moda passageira; e esse é um exemplo perfeito da hipótese de paródia que nós vamos ver mais tarde. Cientistas sabem ler um paper. É o que eles fazem para viver: ler papers, desmontá-los, retirar o que é bom e ruim.

Cientistas nunca dizem que pequenas e tênues descobertas são importantes noticias de capa - jornalistas fazem isso. Mas chega sobre o que eles escolhem cobrir. O que está errado com a cobertura em si? O problema aqui todo provém de um tema central: não há informação útil na maioria das histórias científicas. Uma matéria no Indenpendent de domingo, dia 11 de janeiro de 2004, sugeriu que Viagra encomendado pelos correios é uma fraude porque não contém a "correta forma" da droga. Eu não uso a coisa, mas há 1,147 palavras na matéria. Apenas me diga: Eram sais diferentes, ou preparação diferente, um isômero diferente, uma molécula relacionada, uma droga completamente diferente? Não faço ideia. Nenhum espaço para esse tipo de informação.

Lembra daquelas histórias sobre os perigos dos celulares? Eu estava de férias na época, e não estava olhando pelas coisas obsessivamente no PubMed; mas fora sob o sol eu devo ter lido 15 artigos de jornais sobre o assunto. Nenhum me disse qual foi o experimento que estava avisando do perigo. Qual foi a exposição, o resultado medido, foi em humanos ou animais? Números? Qualquer coisa? Nada. Eu nunca me incomodei em procurar, e então eu estou no mesmo escuro que você.

Por que? Porque jornais acham que você não entende a "parte científica", todas as histórias envolvendo ciência devem ser emburrecidas, deixando pedaços sem suficiente conteúdo para estimular as únicas pessoas que de fato vão procurar e ler sobre - essas são, as pessoas que sabem um pouco sobre ciência. Compare isso com a sessão de comentário de livros, em qualquer jornal. Quanto mais obscuras as referencias a novelistas russos e filósofos franceses você consegue enfiar dentro, melhor o escritor todo mundo acha que você é. Ninguém emburrece a sessão de finanças. Imagine o rebuliço se eu tentasse inserir o termo "biofóton" numa página de ciência sem explicar o que ela significa. Eu posso te dizer, isso nunca passaria dos subeditores e editores de sessão. Mas use numa página de medicina complementar, incorretamente, e ela passa livre.

Estatísticas são o que causam mais medo em repórteres, então eles são simplesmente editados fora, com interessantes consequências. Porque ciência não é sobre como algo é verdade ou não; essa é uma paródia de graduados em humanas. Ela é sobre a margem de erro, significância estatística, é sobre o quão confiável e válido uma experimento foi, é sobre chegar a um veredito, sobre a hipótese, nas costas de muitos pedaços de evidências.

Mas jornalistas de ciência de alguma forma não entendem a diferença entre evidência e a hipótese. O editor de saúde do Times, Nigel Hawkes, recentemente cobriu um experimento que mostrou que ter um irmão mais novo está associado com uma menor incidência de Esclerose Múltipla. EM é causado pelo sistema imune agindo contra o corpo. "Isso é mais apto a acontecer se uma criança num estágio chave do desenvolvimento não é exposta a infecções por outros irmãos, diz o estudo." Foi isso que Hawkes disse. Errado! Essa é a "Hipótese da Higiene", isso não é o que o estudo mostrou: o estudo só descobriu que ter irmãos mais novos parece ser de alguma forma protetor contra EM: ele não disse, não poderia dizer, qual era o mecanismo, como se ele poderia ocorrer através da grande exposição a infecções. Ele confundiu evidência com hipótese. (www.badscience.net/?p=112), e ele é um "comunicador científico".

Então como a mídia circunda a inabilidade deles de fornecer evidência científica? Eles usam figuras de autoridade, a própria antítese do que a ciência é, como se eles fossem padres, ou políticos, ou figuras paternas. "Cientistas hoje dizem... cientistas revelam... cientistas alertam.". E se eles querem equilíbrio, você terá dois cientistas descordando, porém sem explicação do porquê (uma aproximação que é mais perigosa com o mito de que cientista estão "divididos' acerca da segurança do MMR). Um cientista vai "revelar' algo, e então outro vai "desafiá-lo". Parecido com Cavalheiros Jedi.

O perigo da cobertura por figuras de autoridade, na ausência de real evidência, é o que deixa o campo aberto por autoridades questionáveis a se embrenharem. Gillian McKeith, Andrew Wakefield, Kevin Warwick e o resto pode conseguir bem mais, num ambiente onde sua autoridade pode ser aceita como escrita, porque as suas razões e evidências são raramente publicamente examinadas.

Mas também reforça a paródia do jornalista graduado em humanas, que pelo que sabemos possui todos os ingredientes: ciência é sobre desembasadas, incompreensíveis, afirmações de verdades ditadas por cientistas, que eles mesmos são socialmente poderosas, arbitrárias, figuras de autoridade não eleitas. Eles são desconectados da realidade: eles fazem trabalhos que são ou malucos, ou perigosos, mas de qualquer maneiras, tudo na ciência é tênue, contraditória e, quase ridiculamente, "difícil de entender".

A deturpação da ciência é um direto descendente da reação, no movimento Romântico, contra o nascimento da ciência e o empiricismo a mais de 200 anos atrás; ela é exatamente a mesma paranoia fantasiosa do Frankenstein de Mary Shelley, só que não tão bem escrito. Nós dizemos descendente, mas claro, as humanas não avançaram em nada, exceto em inventar o relativismo cultural, que se baseia largamente numa reação de desprezo contra a ciência. E graduados em humanas na mídia, que suspeitam-se a serem intelectuais, desesperadamente precisam reforçar a ideia de que ciência é absurda: porque eles tem se negado acesso ao mais significante desenvolvimento na história do pensamento ocidental por 200 anos, e secretamente, lá dentro, eles estão com raiva com eles mesmos disso.

Isso é o que eu diria a três anos atrás. Mas agora eu estou dentro, eu posso adicionar diferentes elementos a história. Eu sou um cara de boa aparência, mas eu sei que: eu não sou o cara mais popular nas festas de jornalistas de ciências, mas eu sou com certeza falante. Por vários meses eu tive uma espirituosa linha de discussão com um eminente jornalista de ciências, que insistia a me dizer que cientistas precisam encarar o fato de que eles tem que ser melhores em se comunicar com o público comum. Ela é uma graduada em humanas. "Já que você se descreve como uma comunicadora de ciências," eu diria invariavelmente, ao som de risadas ridículas: "Esse não é o seu trabalho?". Mas não, pois há uma popular e grande ideia de que ignorância científica é uma ferramenta útil: se até eles podem entendê-la, eles pensam a si mesmo, o leitor também vai. Que tipo de comunicador isso faz você?

Há somente um departamento de Relações Públicas em Londres que eu conheço razoavelmente bem - é um pequeno mundo de classe média afinal - e eu sei até recentemente, que eles nunca empregaram um único graduado em ciências. Isso não é incomum. Ciência é feita por cientistas, que a escrevem. Então um comunicado de imprensa é escrito por um não cientista, que a publica pelo seu chefe não cientista , que então manda-o para jornalistas sem uma educação científica que tentam passar novas ideias difíceis a uma audiência de, ou leigos, ou mais comumente - já que eles são interessados em ler este assunto - pessoas que conseguem passar em um teste de aptidão bem melhor do que seus intermediários. Finalmente, é editado por todo um time de pessoas que não a entendem. Você pode ficar certo de que pelo menos uma pessoa em qualquer cadeia de "comunicação científica" está somente fazendo malabarismo com palavras numa página, sem sequer ter ideia do que significa, fingindo que possuem um emprego apropriado, com suas canetas todas alinhadas ordenadamente em suas mesas.

É claro que um sistema desses vai criar problemas. A prova disso está em Bad Science, toda semana. Vejo vocês em Berlim.

  1. desastre da MMR. da Wikipedia (http://pt.wikipedia.org/wiki/Tr%C3%ADplice_viral#Autismo_e_Quest.C3.B5es_Pol.C3.AAmicas):
    "Em 1999, o médico Andrew Wakefield publicou o artigo MMR vaccination and autism, estabelecendo uma suposta relação entre a vacina tríplice e o autismo.Diversos estudos médicos foram conduzidos desde então a fim de se comprovar ou não essa relação, sendo que não houve evidências nesses novos estudos acerca dessa hipótese. Em 2010, o Conselho Médico Geral britânico considerou que o dr. Wakefield agiu de maneira antiética e desonesta ao vincular a vacina tríplice ao autismo. Ainda de acordo com o Conselho Médico Geral britânico, a sua conduta trouxe má reputação à profissão médica depois que ele coletou amostras de sangue de jovens na festa de aniversário de seu filho pagando-lhes £5. Considera-se também que o sarampo tenha ressurgido no Reino Unido devido ao receio dos pais em aplicarem a vacina trípice em seus filhos: as taxas de vacinação nunca mais voltaram a subir e surtos da doença tornaram-se comuns. Outra corrente acusa a influente indústria farmacêutica de fazer lobby para "abafar" essa informação."
  2. Seroxat (Paroxetina): http://en.wikipedia.org/wiki/Paroxetine#Controversy 
  3. Matéria da Indenpendent sobre Ataques do coração e Ibuprofeno: http://www.independent.co.uk/life-style/health-and-families/health-news/study-links-common-painkillers-ibuprofen-and-diclofenac-to-increased-risk-of-heart-attack-8636745.html

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